segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Era dezembro

Era dezembro de mil novecentos e quarenta e sete...
Aquele final de ano me foi totalmente diferente. Fui passá-lo em Bauru, na casa da minha querida tia Adélia. A minha primeira surpresa foi ver um lindo presépio montado no canto da sala de jantar. Fiquei inebriada com a visão. Com nove anos de idade, morando em lugar pequeno, só havia visto um na igrejinha onde eu morava e apenas uma vez. Um padre foi lá para realizar a missa do Galo – meia- noite da véspera de Natal. Nem Papai Noel eu sabia como era. Sabia só que era bem velhinho e com barbas compridas, muito brancas e vinha trazer presentes em horas descabidas, quando estávamos distraídos. Outra surpresa tive ao saber que esse Papai Noel não existia, de verdade; era apenas uma lenda que embalava as mentes das crianças, despertando sempre uma expectativa, uma ansiedade nessa época festiva. Foi minha tia que, cautelosamente me revelou essa verdade. Não fiquei triste. Fiquei feliz em descobrir como meus pais eram legais, sempre satisfazendo nossos desejos, mesmo se sacrificando, algumas vezes. Retornei das férias com muitos mimos. Mas queria ter um presépio igual ao da tia Adélia. Não esperei muito tempo. No meu aniversário de dez anos, lá estava a querida tia, com uma grande caixa onde, ao abrir – que surpresa – estavam lá os personagens desejados, feitos em cerâmica. Naquele Natal não fui para Bauru. Montei meu presépio, feliz da vida. A árvore de Natal mamãe só montou dois anos depois. Lá se vão sessenta e dois anos... O pequeno presépio me acompanhou durante todos esse anos. Algumas imagens foram ficando descascadas, desbotadas e substitui por outras, mas estão bem guardadas. Do original ficaram os carneirinhos, dois pastores, uma carregadora de água. Estes já estão se preparando para fazer sua apresentação nesse ano. Os anos passam céleres, mas as boas lembranças continuam intactas. São elas que nos fazem continuar a jornada, felizes, apesar das perdas. São elas que nos dão ânimo para viver, compartilhar. O importante é passá-las adiante para os filhos, netos, amigos. São nossas histórias...

Querido papai noel

Há quanto tempo não nos vemos, não é mesmo? Sua lembrança vem de longe...de quando eu ainda era pequena, lá pelos idos anos quarenta, no século passado... Você nunca era visto; vinha em horas em que me distraia e meu presente sempre estava lá, mesmo que a situação financeira não fosse lá aquelas coisas. Meu pedido era atendido. No dia de Natal era só procurar debaixo da cama ou sob o travesseiro. Certa vez pedi uma boneca grande, que parecesse um nenê de verdade. Quando a encontrei, feliz da vida, corri para a porta a ver se o senhor ainda estava por ali. Que engraçado... há poucos metros de casa ia um andarilho esfarrapado, barbudo, descalço. Levava às costas um saco de estopa. Mamãe logo disse que era o Papai Noel. Acreditei, mesmo porque naqueles tempos não havia televisão ou qualquer outro tipo de comunicação, principalmente na cidadezinha onde morava. De verdade , eu não sabia como você era. Anos mais tarde, ao visitar uma tia que havia nos convidado para passar o Natal em sua casa, na cidade vizinha, meus pais me levaram para ver uma loja de brinquedos – Casa das Novidades - que ficava aberta a noite. Em meio a caixas de presentes, lá estava você, impaciente e chutando algumas delas. Todo de vermelho era muito bonito, mas fiquei decepcionada com sua conduta. Até você não era perfeito como eu imaginava. Também, devia estar aflito,pois tinha ainda que entregar tantos presentes... Bem depois, descobri que aquele não era você. Estava representando o seu papel para ganhar alguns caraminguás. Devia estar com sono, querendo ir dormir em sua casa. Quando completei nove anos fui passar o Natal na casa da tia Adélia. Aproveitando minha curiosidade, calmamente, com seu jeitinho especial, ela me explicou que o Papai Noel era uma lenda e quem me presenteava era você, meu pai. Mas eu tinha que guardar segredo pois meus irmãos ainda acreditavam na sua existência. Não fiquei triste. Ao contrário, fiquei muito feliz. Em todos os Natais de minha vida você esteve presente, dando presentes. Até que se foi, num dia sete de dezembro, pouco antes da festa natalina. Porém, antes de partir me deixou a incumbência de substituí-lo. Mesmo tristes, na nossa confraternização costumeira, antes da ceia, todos recebemos presentes do Papai Noel:- filhos, netos, noras e genros. Mais um Natal se aproxima; o coração confrange, aperta, dói. Não terei sua presença física, mas sei que estará aqui, com certeza. De onde você estiver terá permissão para dar uma passadinha rápida, deixando o presente de sua presença. Papai Noel existe, sim. É você, meu pai. E como desempenhou bem esse papel!